São Paulo – Existem muitas formas de ficar rico no Brasil, mas uma estratégia pode se revelar uma surpresa e tanto no clima econômico de hoje em dia: garantir um cargo no governo.
São Paulo – Existem muitas formas de ficar rico no Brasil, mas uma estratégia pode se revelar uma surpresa e tanto no clima econômico de hoje em dia: garantir um cargo no governo.
Enquanto funcionários públicos da Europa e dos Estados Unidos tiveram os salários achatados ou os cargos eliminados de vez, alguns empregos públicos no Brasil oferecem salários e benefícios que fazem seus colegas nos países desenvolvidos passarem vergonha.
Um servidor de um tribunal da capital brasileira, Brasília, ganhava US$ 226 mil anuais – mais do que o presidente do Supremo Tribunal Federal do país. Igualmente, o departamento de rodovias de São Paulo desembolsava a um de seus engenheiros US$ 263 mil por ano, mais do que recebe a presidente da nação.
E também temos os 168 servidores do Tribunal de Contas do Município São Paulo (TCM) que recebiam salários mensais de pelos menos US$ 12 mil e, às vezes, até US$ 25 mil – mais do que o ordenado do prefeito da maior cidade do país. Na verdade, o prefeito à época fez uma piada comentando que planejava se candidatar a um emprego no estacionamento do prédio da Câmara Municipal quando o mandato terminou, em dezembro, depois de o poder legislativo da cidade ter revelado que um dos manobristas recebia US$ 11.500 mensais.
Enquanto a antes florescente economia brasileira dá uma brecada, esses 'supersalários', como ficaram conhecidos por aqui, alimentam novo ressentimento quanto à desigualdade em meio às burocracias de difícil controle do país. Em conjunto, os sindicatos poderosos de determinadas categorias de funcionários públicos, a forte proteção jurídica para os servidores, um setor governamental em processo de inchamento – que criou muitos empregos novos pagando bons ordenados – e benefícios generosos que podem ser explorados por gente bem informada fizeram do setor público brasileiro um cobiçado bastião de privilégios.
Porém, os espólios não são distribuídos igualmente. Enquanto o ordenado de milhares de funcionários públicos excede os limites constitucionais, muitos mais se desdobram para sobreviver. Pelo país inteiro, professores e policiais costumam receber pouco mais de US$ 1 mil mensais e, às vezes, menos, exacerbando os temores prementes com a segurança e o sistema educativo, titubeante há tempos.
'As distorções salariais em nossa burocracia pública chegaram a um ponto em que se tornaram uma desgraça total e absoluta', disse Gil Castello Branco, diretor do Contas Abertas, grupo de vigilância especializado em vasculhar os orçamentos governamentais.
Os funcionários públicos privilegiados, antes chamados marajás em referência à opulência da antiga nobreza indiana, sempre existiram no Brasil. Porém, como o país nutre ambições de subir ao ranking das nações desenvolvidas, uma nova lei da liberdade da informação exige que as instituições públicas revelem os ganhos dos servidores, desde os de nível baixo, como auxiliares e escreventes, a ministros de Estado.
Embora algumas autoridades resistam às regras, novas revelações das entidades públicas apresentaram diversos casos de funcionários públicos recebendo mais do que os ministros do Supremo Tribunal Federal, que receberam aproximadamente US$ 13.360 mensais em 2012, quantia estabelecida na Constituição como o teto salarial do setor. Somente no Senado e Câmara dos Deputados, mais de 1.500 pessoas recebiam acima do limite constitucional, segundo o Congresso em Foco, outro grupo de vigilância.
Juízes estaduais podem ganhar muito mais, com alguns recebendo por mês mais do que colegas em países ricos obtêm num ano inteiro. Pouco tempo atrás, um juiz de São Paulo ganhava US$ 361.500 por mês.
As revelações recentes, incluindo a de um auditor do Estado de Minas Gerais que ganhava US$ 81 mil mensais e de um bibliotecário que embolsava US$ 24 mil por mês, provocaram fortes reações em meio a certos grupos. Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, cancelou os supersalários dos 168 funcionários do TCM em dezembro. Farto, outro juiz federal concedeu liminar em outubro suspendendo os pagamentos de 11 ministros, mas o procurador-geral disse que tentaria derrubá-la.
Alguns historiadores culpam Portugal, o antigo colonizador, por criar uma burocracia pública poderosa na qual mandarins exercem grande influência e embolsam salários fora do comum. O complexo sistema judiciário brasileiro também oferece maneiras para determinados funcionários públicos graduados contornarem os limites constitucionais aos salários. Alguns recebem pensões por passagens anteriores no governo – muitas vezes o ordenado integral à época da aposentadoria – após ocuparem outro cargo público muito bem remunerado.
E também existem os subsídios habitacionais e alimentares, os reembolsos generosos por distância percorrida a serviço e, é claro, as brechas. Um dispositivo de 1955 permite a certos funcionários públicos tirar licenças de três meses a cada cinco anos. Contudo, quem abre mão da licença, agora adotada com a intenção de incentivar os empregados a fazer cursos de pós-graduação, pode optar por receber o dinheiro extra.
Membros graduados do Partido dos Trabalhadores, atualmente no governo, como o ministro da fazenda Guido Mantega, conseguem driblar o limite constitucional recebendo US$ 8 mil mensais por atuar como diretores do conselho de administração de estatais. Muitos legisladores têm direito a bônus anuais de mais de US$ 26 mil para adquirir vestuário, como ternos executivos.
Ainda assim, no mundo desenvolvido, o funcionalismo público brasileiro é invejado em alguns aspectos pelo profissionalismo. Provas rigorosas para uma série de cargos públicos cobiçados geralmente eliminam os candidatos despreparados. Exemplos de excelência, como algumas instituições públicas de pesquisa, conquistaram aclamação em áreas como agricultura tropical.
Porém, contribuintes reclamam dos privilégios no setor público, cujos números incharam cerca de 30 por cento na última década, englobando 9,4 milhões de funcionários num país de 194 milhões de habitantes. Sindicatos poderosos bloqueiam as tentativas de demitir os servidores, tornando tais empregos extraordinariamente estáveis e protegidos.
Enquanto o governo brasileiro se financia confortavelmente por meio da arrecadação de impostos e emitindo títulos da dívida pública, serviços como a educação e o saneamento permanecem lastimáveis. Apesar da alta carga tributária, o Brasil se encontra entre os 30 piores países industrializados e desenvolvidos na qualidade de serviços oferecidos aos cidadãos em relação aos impostos pagos, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, entidade sem fins lucrativos.
Alguns políticos estão sob escrutínio pessoal. Fernando Collor de Mello, ex-presidente que antes denunciava os marajás e agora é senador, foi acusado há pouco tempo de gastar mais de US$ 30 mil mensais em dinheiro público para empregar um jardineiro e dois arquivistas.
No Maranhão, um dos Estados mais pobres do Brasil, os legisladores concederam a si mesmos o equivalente a 18 salários mensais – cada um no valor aproximado de US$ 10 mil – num único ano, justificando a modificação como subsídio em função do custo de vida.
A nova lei da liberdade de informação, apoiada pela presidente Dilma Rousseff, que recebe aproximadamente US$ 174 mil anuais, pretende denunciar tais práticas. Sem surpresas, interesses governamentais arraigados estão demorando em cumprir a lei.
Quando finalmente o Congresso decidiu em 2012 permitir às pessoas o direito de obter informações salariais de seus funcionários, ele exigiu que fosse achado o nome de cada funcionário para ser solicitado online. Trocando em miúdos, se alguém quisesse dados sobre os 25 mil trabalhadores do legislativo, a pessoa teria de identificá-los de forma independente e enviar 25 mil pedidos diferentes.
Quem dera fosse mais fácil aqui em São Paulo. Uma servidora do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivete Sartorio, teria recebido US$ 115 mil após convencer os superiores de que deveria ser compensada por não tirar licenças. Porém, quando recentemente questionado sobre seus salários, Rômulo Pordeus, falando em nome do Tribunal, afirmou ser necessário ter o 'número da matrícula' de Sartorio para atender à solicitação.
Quando questionado como um contribuinte curioso poderia obter tal número, ele respondeu que Sartorio tinha sua posse e o assessor não desejava incomodá-la a esse respeito.
'Não vou pedir o número da matrícula dela porque é chato, entendeu? Ninguém gosta de contar quanto ganha.'
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